Sofia chegara às 15:00 horas, tendo uma consulta marcada
para as 15:30. Ela sabia que não seria atendida antes das 16:00, mas não
conseguia não chegar antes. Já era uma antiga frequentadora desse consultório e
sempre incorria nas mesmas esperas. Esse, aliás, era um dos motivos
recorrentes de reflexão (dos muitos que surgiam na espera): por que os
médicos de qualquer espécie agendam horários que não podem cumprir? E por que
eu ainda chego mais cedo?
Neste dia em questão,
enquanto folheava uma revista Caras do ano retrasado,
trabalhava a hipótese de tais atrasos nas consultas serem práticas
exclusivamente brasileiras e cogitava uma viagem ao exterior – algum país ainda
na América Latina – para averiguação in loco, quando um rapaz
bastante interessante surgiu na recepção. Definitivamente não tinha padrões de
um galã hollywoodiano, mas eles não
estavam em um desfile de moda. Era um consultório de odontologia, tornando-se,
assim, fácil de se impressionar com aquela destoante figura.
Então aquele momento mágico
aconteceu. Ele a olhou. E olhou novamente. E ela retribuiu, com um sorriso
recatado, virando o rosto e fitando a notícia antiga, como se estivesse
bastante interessante. Quando levantou o rosto, lá estava ele, fitando-a.
Ponderou que aquele sorriso até tinha algo de hollywoodiano, no fim das contas.
Quando começava a travar uma
batalha contra sua timidez – afinal aquele homem era lindo e estava claramente
flertando com ela – decidiu, com ares de mulher moderna e esclarecida, que iria
facilitar uma aproximação. Esboçava levantar em busca de uma nova revista, na
bancada ao lado dele, quando, nesse mesmo instante, a recepcionista convocou
para dentro algum nome que ela estava distraída demais para prestar atenção.
No minuto seguinte, aquele
par de olhos seguiu em direção ao interior da sala de consultas. Sofia
praguejou mentalmente por não ter ouvido o nome dele – e até deixou escapar um
muxoxo que não passou despercebido pelos demais pacientes – mas ficou no
aguardo do seu retorno.
Enquanto isso, não deixou de
constatar que ele chegou cerca de cinco minutos antes de ser chamado e que já
eram 15:40. Ele, portanto, provavelmente considerara o atraso e calculara com
maestria sua chegada charmosa ao recinto. Tal percepção só fez crescer a
vontade de interagir com aquela criatura fantástica. Poderia puxar uma conversa
animada sobre isso, pensou Sofia, já visualizando o diálogo entre eles.
Após alguns minutos de
espera, ele saiu no mesmo momento em que a recepcionista bradava: Sofia
Vasconcelos! Ela se levantou, eles trocaram olhares intensos, enquanto
seus corpos quase se tocavam, caminhando em sentidos opostos. Ela entrou na
sala. Ele, de saída, ainda olhou para trás mais uma vez e soltou um lindo
sorriso (que a fez se perguntar: o que esse homem veio fazer aqui com
esses dentes perfeitos?).
Ela desejou mais que o normal
que sua consulta fosse breve. Menos de vinte minutos depois, com a boca ardendo
da limpeza realizada, saiu às pressas para procurá-lo nos arredores do local.
Ele poderia estar lá,
encostado displicentemente em uma pilastra próxima, esperando-a com uma revista
mais nova e dizendo: esta aqui deve ser
mais interessante do que aquela antiga que você lia com tanto entusiasmo,
como sugeriu uma das muitas fantasias da mente de Sofia enquanto o dentista
analisava sua higiene bucal. Ou ele poderia simplesmente dizer que não sabia o
que tinha feito-o esperar, mas que sentira uma forte ligação entre eles (ela
também vislumbrou tal hipótese).
É provável até, abusando das
conjecturas, que caso tivessem se conhecido em alguma roda de amigos, em outras
circunstâncias, se dessem muito bem. Ambos tinham personalidades bastante
parecidas e gostos em comum, caso isso pudesse ser posto a prova.
O fato, no entanto, diferente
das muitas possibilidades, era apenas um: ele não estava lá. Nem perto. Já
tinha ido embora. Sofia olhou em volta e suspirou, resignada. Na mesma
intensidade com que vieram tais conjecturas, elas também se esvaíram. Ela riu –
dessa vez incontrolavelmente – das suas muitas fantasias sobre o fato e
constatou que aquela espera tinha sido levemente vantajosa em relação às anteriores.
Lembrou-se do sorriso dele
uma última vez e até guardou na memória... Até que o próximo belo sorriso
dirigido a ela ou a relação de compras da semana o substituísse.
que orgulho de ter uma amiga escritora!!!!!!!!!!! lindo :) e coitada de sofia...hehehe.
ResponderExcluirMuito bem escrito Belzita! Quantas vezes a gente dá uma de Sofia, hein? Parabéns linda.
ResponderExcluirjuro como me identifiquei bastante, sempre soube que você mandava muito bem belzinha, agora escreve com mais perfeição ainda! que o próximo ^^
ResponderExcluirAdoro você escrevendo, sua linda (Eu achei que tinha comentado aqui, deve ter dado blogbug).
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