1 de fev. de 2012

Pra ser sincero...


“- Pra ser sincero, eu não te amo.”
Aquela frase não saia de sua cabeça desde que ouvira, há três dias. Trancara-se no quarto tentando entender a súbita reviravolta na sua vida a despeito dos protestos dos amigos, que diziam que ele não valia a pena, que havia sido melhor assim. Ela só conseguia se questionar. Como assim não amar? E tudo que foi dito? E os momentos regados a risadas sinceras... Ou melhor, será que eram sinceras mesmo? E aqueles abraços apertados em tempos de crise ou até sem motivo algum? O que pensar, então, sobre as declarações que foram trocadas... “Com você é como se eu finalmente pudesse respirar em paz?”, “nunca me senti assim com ninguém antes”... Como uma simples frase podia servir como ponto final para todas as outras?
Depois do choque momentâneo da revelação, tentara ser fria. Não quis ver ninguém, não quis desabafar. Disse, apenas, que precisava de um momento só seu. Então fechara os olhos.
Quase como uma facada aquela lembrança apareceu: os olhares se cruzaram no meio de tantas pessoas em uma avenida qualquer, num dia de carnaval. E, diferente dos olhares lascivos que procuram presas fáceis e descartáveis para sua momentânea diversão, aquela troca foi intensa e profunda, pedia algo mais. E rendeu algo mais. Ele decorou seu telefone em meio ao barulho ensurdecedor e disse que precisava ir, mas que entraria em contato. Ela, mesmo incomodada com a situação (por que estou dando meu número para esse cara?), se rendeu.
Na quarta-feira de cinzas, recebeu uma mensagem de texto, convidando-a para a mesma rua onde tinham se visto. Lá chegando, e desta vez sem nenhum barulho – o lixo ainda não havia sido de todo retirado e não havia sinal de pessoas que agora achassem o local interessante, como há alguns dias – ficou constrangida com a ideia de ter sido tão fácil. “Quem ele deve pensar que eu sou?“, questionou-se. Mas ao novamente cruzar seu olhar com o daquele rapaz, que vinha devagar na outra direção, era como se ele entendesse seus receios, ao mesmo tempo em que dizia, com aqueles olhos, que ela não precisava se preocupar.
Imaginava que seguiria um diálogo constrangido, mas a sintonia entre eles parecia transcender a falta de conhecimento sobre o outro. Travaram um diálogo que fluiu tão naturalmente quanto se esperaria de amigos próximos. E ela, naquele momento, considerou-se uma pessoa de muita sorte.
Olhos abertos, lágrimas escorrendo deles. Era irônico como lembranças de momentos felizes conseguiam torturar tanto. Se era para terminar assim, questionava-se, por que começou? Por que iludi-la com um romance súbito? Ela nem estava procurando por isso quando aconteceu. E vivia muito bem sem ele... Até conhecê-lo. Se ele pensava em ir embora, por que razão teria aparecido?
Lembrou-se, então, não sem uma dolorosa pontada no estômago, daquele sorriso. Aquele que sabia que era reservado a ela... O que seria dele agora? Encontraria outro “alvo”? Combinar-se-ia com o olhar sedutor e faria outra vítima em qualquer esquina? Ou apareceria sinceramente quando visse outra pessoa? As múltiplas possibilidades que não a incluíam deixavam-na em pânico. Não saber dele impedia que ela sequer pensasse em si por alguns instantes, tentando se restabelecer. As dúvidas não paravam de surgir: se não era amor, o que mais seria? Paixão? Curiosidade? Diversão?
Alguns dias passaram, não sem menos divagações e não de maneira rápida. Mas a dor foi – contrariando suas lamentações de outrora e quase imperceptivelmente – ocupando lugares secundários. Quando via a foto dele, ou ouvia seu nome por coincidência, estremecia, mas sabia que tinha que superar. Eventualmente se flagrava pensando nele e isso fazia seu coração apertar, mas não tanto quanto antes. Nos dias mais calmos, sentia sua falta com mais intensidade, e tentava imaginar onde ele estaria no mesmo momento. Se pensava nela. Provavelmente não, concluía. Ele seguira em frente.
Se ele a ensinara algo além de como sofrer intensamente, havia sido que existem muitas possibilidades nesta vida. Quando menos se imagina, alguém pode aparecer e mudar seu destino. Essa pessoa pode ir embora depois, para que outras apareçam também. Poderia ser uma eterna amargurada lamentando ter perdido “a chance da sua vida” ou poderia se conformar de ter feito o que podia para que desse certo naquele relacionamento.
Talvez, concluía, ele tenha sido bem menos feliz do que ela quando estiveram juntos. Então o que para ela parecia a ruptura de algo que dava certo, para ele era visto como um alívio. Seria possível ter sido egoísta dessa maneira? Seria, ponderou.
A felicidade não é óbvia, nem o que se chama por aí de amor. Nenhum sentimento é óbvio. Encontrar reciprocidade, por este ângulo, parece uma exigência muito grande a se fazer, principalmente lidando com o acaso. Sua melhor chance era continuar vivendo e colocando-se no “jogo da vida” para novos lances, novas apostas. Abrir o coração para outras ocasiões, por mais clichê que isso soasse.
Pensar nele era ter certeza de que precisava recomeçar. E foi parecendo claro que a dor chega a um ponto que reverte suas energias. Não conseguindo mais ser apenas dor, torna-se aprendizado. Tinha, afinal, uma história para contar.
Olhou para frente e viu seu grupo de amigos conversando displicentemente... Percebeu que a mesma vida que lhe fizera sofrer também lhe dera outras tantas oportunidades de ser feliz (que, por vezes, acabam passando despercebidas, fantasiadas de lugar-comum).
Tentar entender por que isto acontece é tão complicado que vale mais a pena estar atenta. Se era para ser assim, sem ele, seria. Mas não seria de qualquer jeito... Era a sua vida e, até onde sabia, era única. Seria da melhor maneira que soubesse fazer. Abriu um sorriso e lembrou-se de como não era impossível se divertir. Ele poderia não amá-la, provavelmente não ama mesmo. Mais um motivo, ponderou, para amar ainda mais a si mesma.

2 comentários:

  1. Pra variar perfeito o texto Belzita! Parabéns linda =****

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  2. Eu te amo, ai como eu te amo. Você nunca saberá o quanto suas palavras me motivam, o quanto me confortam. Parabéns primeiramente por estar dando a honra de ler isso aqui, e parabéns pelo texto <3.

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