30 de mai. de 2012

Uma saudade singular


  Tenho saudade daquele sorriso sereno, tão bonito, nem sempre estampado, mas nunca escondido; daquelas preocupações pontuais que pareciam, às vezes, banais, mas guardavam, verdadeiramente, o indizível. Sim, tenho essa saudade daquilo que não era dito, no entanto pairava no ar, com gestos discretos e até tímidos, pousado em ajudas sem cobrança alguma, em sentimentos guardados para si, em um gostar sem anúncios, genuíno, de fazer o melhor para os outros sem esperar, sem espalhar, sem exigir. Tenho saudade de poder acumular novas lembranças, ainda que cotidianas, de observá-la resolver enigmas complicados com naturalidade. De sentar ao seu lado e sentir que o amor é muito mais que palavras e que até grandes erros carregam chances de voltar atrás se há, de fato, vontade. Tenho saudade de quem já tentei ser, para ser melhor e lhe orgulhar; de ouvi-la falar em esforço, em superação, como quem entende do que está falando e já ouviu muitos nãos. Aprendi a ter saudade de perceber o carinho como algo não óbvio, que vaga em entrelinhas, nos atos mais corriqueiros, fugindo a regras do que é certo ou inteiramente errado, mostrando que cada sentimento, em cada um, tem seu exclusivo lugar e significado.

  Ao abrir aquele livro em especial, é inevitável reler um trecho que parecia um prenúncio desse aperto que, hoje, não deixa em paz:


"A saudade é um parafuso,
Que, quando entra, não cai,
Só entra se for torcendo
Porque batendo não vai.
Depois que enferruja dentro
Nem destorcendo não sai."
(Eurícledes Formiga)

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