Da janela do avião, via a cidade diminuir e as formas se
perderem aos poucos, tornando-se pontos de luz. Pareceu-lhe uma ironia que, de
cima, o lugar que lhe era tão familiar e neutro se mostrasse extremamente gracioso,
com uma beleza formada, inclusive, pela falta de simetria, em uma espécie de
desorganização ordenada. Quando deixamos de olhar de maneira isolada e
enxergamos o conjunto, eventualmente, podemos ter essa sensação.
Estava viajando com uma vontade enorme de ficar. Não soava certo
deixar situações mal resolvidas, embora tivesse se esforçado para um resultado
diferente. Aquela visão e a percepção de uma imensidão inexplorada, entretanto,
em contraste ao pensamento na brevidade da existência, fizeram-lhe entender que
não se pode ter controle sempre.
Decidiu ali, no início da madrugada de um sábado, deixar-se
levar verdadeiramente. E assim foi. Em busca de novos cenários, conheceu mais,
e principalmente, a si mesma.
Nós somos, inevitavelmente, soma. De onde estivemos, do que
erramos, do que acertamos, do que sentimos, daquilo que lemos, vemos, ouvimos,
fazemos e até do que quisemos fazer e, muito importante, de quem conhecemos.
Sobre as pessoas: existem aquelas que conhecemos e convivemos
por apenas um dia ou momento, mas nos fazem crer que, espalhadas ao longo desse
mundo gigante, existem tantas outras com as quais seria prazeroso jogar
conversar fora ou ao menos trocar um sorriso.
Também há as que sempre estiveram por perto, mas conseguem
surpreender, evidenciando como desvelar alguém pode ser recompensador, embora
traga rachaduras à tona e nem sempre saibamos lidar com isso.
Levantar voo despertou-lhe, então, essa necessidade de
conhecer e se esforçar para apreender, a tudo e a todos, perto ou longe, da
maneira que pudesse, para que a soma de suas experiências fosse, a despeito da
sua imperfeição, bela.
Na descida, cogitou a não existência de uma partida. Não
saímos de nós mesmos, não há como fugir. O que pode existir em nós é vontade,
que acaba sendo nossa dimensão. Vontade de mudar, de melhorar, de sobrevoar o
que se é e vislumbrar o quão grande se pode ser. Para isso, é necessário tirar
os pés do chão.
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