26 de fev. de 2013

O futuro imperfeito do ser e estar


Era extraordinário, entendam bem. Era simples num universo complexo. Havia complicações, verdade. Mas eram externas, quase que obrigatórias e nada sobressalentes diante do todo que parecia um presente divino, até para quem não acredita nessas coisas. Fato era que não soava comum.
Entre as lembranças que não conseguem se fazer esquecer, ainda que com grande esforço, figuram momentos singelos. Olhares, sinais sutis que pareciam dizer: não vou deixar você ir. E não deixavam. Achou-se até que não deixariam jamais, mas de certo temos apenas a incerteza. Batido, não? Ao perder algo que aparentemente me diferenciava, fiz questão de – após a fase do “por que essas coisas aconteceram comigo?” – me jogar num grupo genérico. Fingindo que acontece sempre e que não foi nada de mais ter perdido, buscando uma explicação que não existe.
Pensei, por exemplo, que algo tão doce não poderia mesmo durar, dado seu caráter sobre-humano. De tão bom, não poderia ser sustentável. Mas tudo ficava ainda mais fácil e seguro a cada gesto, palavra, recomendação ou sorriso. A tranquilidade quase tangível não daria margem para argumentos como este.
Depois, naturalmente, julguei tudo aquilo superestimado. Não poderia ser tão bom. Coisas ruins já estavam incrustadas, só não visíveis. Respeito este ponto de vista com a mesma intensidade em que discordo dele, embora tenha, por momentos, ponderado adotá-lo. Um acontecimento ruim não anula sentimentos bons, aprendi. Sentimentos bons, no entanto, quando confrontados por dificuldades, potencializam as dores relacionadas. Dói mais quando se machuca onde não se costuma machucar. Nem por isso vou julgar os momentos felizes como uma projeção errônea de sentimentos.
Não questiono se era para terminar assim, não mais. Verdade seja dita, analisar cada ato que desencadeou no presente seria desmerecer o que já existiu. Buscar falhas, buscar indícios, isso tudo é possível, mas é desgastante e amarga um sabor já imaginário daquilo que poderia ter sido diferente. Aquilo que a gente não prova, mas sente tanta vontade de fazê-lo que o corpo aguça todos os outros sentidos para tentar absorver de alguma forma.
Era doce, tornou-se estranho, tornou-se passado. Lembranças boas e ruins de algo bom. Em maior parte, positivas, mas as ruins, por hora, protagonizam esse filme – como é de costume. É possível que, com o tempo, não se saiba nem por que estão ali, com aquele lugar de destaque no relicário da mente. É possível que já não sejam nem confusão, nem mágoa, nem esperança. Aqui jaz... O quê? Não vai mais importar. Só. E tudo isso.

Assinado:
Alguém que não é, não foi, nem será, por si só, nada de extraordinário.

2 comentários:

  1. Mabel, sensibilidade em passar idéias... com certeza pessoas como vc são extraordinárias pois reconhecem que sozinhos não chegam a lugar nenhum. Poder realizar objetivos só vale a pena quando compartilhamos essas conquistas com quem amamos e com quem podemos ofertar o bem, o nosso próximo. Parabéns mais uma vez pelo texto, tenho certeza que logo logo vc colocará "inferências" em um livro.

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  2. Maria, você não sabe como me motiva ler um comentário desses. Obrigada pelo incentivo de sempre!

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